Imagine uma terapia que utilizasse células capazes de reparar danos em um tecido específico? Ou melhor, imagine se idosos que sofrem com doenças neurodegenerativas, como o Alzheimer, tivessem a chance de regenerar seus neurônios?
Apesar de parecer filme de ficção cientifica, de certo modo, algumas dessas abordagens já podem ser realidades no ramo da medicina regenerativa. Os estudos de terapia com células-tronco embrionárias procuram formas de reparar danos causados às células de diversas partes do nosso corpo.
A terapia com células-tronco embrionárias envolve a diferenciação e multiplicação dessas células em meio de cultura. A partir dessas células, podem ser produzidas outras específicas, como musculares, neurais e sanguíneas.
O advento das células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs)
Apesar dos avanços, leis de biossegurança dificultam significativamente o uso de células-tronco embrionárias na medicina regenerativa, especialmente o seu comércio. Além disso, barreiras éticas e até religiosas geram forte debate acerca da utilização destas células.
Como células-tronco embrionárias derivam de embriões congelados, seria ético retirar as células desses embriões para utilizar em tratamentos? Questões como essas, norteiam calorosos debates sobre o assunto ate hoje. Preocupações adicionais que envolvem o uso de células-tronco embrionárias são o consentimento informado, incentivos impróprios e preocupações de saúde e segurança das mulheres que doam óvulos para a geração de embriões por fertilização in vitro.
Felizmente, a ciência possui a capacidade de contornar essas objeções. Por isso, outra opção para a geração de células embrionárias foi desenvolvida, utilizando células somáticas (ou adultas), como fibroblastos, sangue do cordão umbilical ou células do sangue periférico. Essa nova metodologia para geração de células-tronco, recebeu o nome de células-tronco pluripotentes induzidas (iPSCs).
A iPSCs são células adultas que, através da expressão de fatores de transcrição gênica específicos, ganham uma característica bastante particular de células embrionárias, a pluripotência. Basicamente, os cientistas desenvolveram um método pelo qual essas células somáticas são cultivadas em meio de cultura, e por meio de fatores de expressão gênica, é possível reprogramar essa célula somática para voltar a ser uma célula-tronco embrionária.
Assim como as células-tronco embrionárias, as iPSCs podem tipicamente proliferar, se autorrenovar indefinidamente in vitro e se diferenciar em células de todas às três camadas germinativas primárias (ou seja, ectoderma, mesoderme e endoderme), bem como células germinativas que dão origem aos gametas.
Qual a importância desse tipo de abordagem para o avanço da ciência regenerativa?
Essa nova estratégia de reprogramação celular despertou grande interesse na comunidade científica e médica, pois as iPSCs podem ser uma fonte alternativa de células-tronco embrionárias.
A terapia celular baseada na utilização das iPSCs representa esperança para o tratamento de variadas doenças que não possuem cura ou que as terapias atuais não sejam tão eficazes, como nas doenças neurodegenerativas, infartos, diabetes, entre outras. A regeneração de tecidos lesados ou danificados é outra aplicabilidade bastante relevante para a medicina regenerativa. Diferentes lesões, como queimaduras na pele ou lesões na medula podem ser tratadas pela terapia utilizando iPSCs.
Doenças hepáticas podem levar a perda de função das células funcionais no fígado, os hepatócitos. A utilização de iPSCs propicia a geração de hepatócitos saudáveis para o tratamento de diversas desordens hepáticas. Evidências recentes apontam também para a possibilidade de uso das iPSCs para expansão sanguínea de vários componentes celulares. Por exemplo, essa tecnologia pode ser utilizada para a geração de glóbulos vermelhos, e assim, possibilitar a utilização dessas células em diferentes tratamentos.
Um ponto de destaque é a vantagem no uso em transplantes. Essas células podem ser produzidas de maneira específica a partir de células do próprio paciente, assim podem ser evitadas complicações com a rejeição pelo sistema imunológico. Ensaios pré-clínicos não mostraram nenhuma evidência de aumento da proliferação de células T ou uma resposta imune secundária específica do antígeno após a utilização de iPSCs em transplante, atestando a segurança desse tipo de metodologia.
Em casos de células que possuem alguma mutação genética que levam ao desenvolvimento de doença ou síndrome, a mutação pode ser inicialmente corrigida para gerar iPSCs normais. Essa manipulação gênica é feita utilizando ferramentas com a CRISPR, onde é possível editar o código genético de forma específica. Após a correção, as iPSCs são diferenciadas em tipos celulares específicos, podendo ser transplantadas para o órgão ou tecido alvo.
Utilização das iPSCs na modelagem de doenças
Com as iPSCs, é possível entender a modelagem de doenças com a extração da célula de um paciente e reprogramação para outra célula específica. Assim, é factível entender melhor a etiologia e possíveis mecanismos fisiopatológicos da patologia, comparando com o mesmo tipo celular de um indivíduo saudável.
Outro grande campo de interesse para a tecnologia de iPSCs é a produção de novos fármacos e triagem de medicamentos já existentes. Imagine extrair células somáticas do paciente, reprogramá-las, diferenciá-las em vários tipos celulares e, a partir disso, identificar o fenótipo molecular e celular daquela determinada doença? Assim é possível uma melhor compreensão da patologia com o intuito de testar novos fármacos ou utilizar outros medicamentos já consolidados para outras doenças, mas que podem ter novos potenciais de tratamento.
Como as iPSCs são derivadas de pacientes individuais, elas oferecem aos cientistas a oportunidade de modelar as doenças de forma personalizada. Isso possibilita a triagem das diferenças genômicas entre os indivíduos, o que podem auxiliar na progressão da doença e a triagem de agentes farmacológicos para encontrar o tratamento ideal para cada indivíduo.
Essas aplicações das iPSCs baseiam-se na sua propriedade de auto renovação contínua e pluripotência, possibilitando a geração de extensas bibliotecas celulares. Dessa forma, tornam-se adequadas para serem usadas também para previsão de toxicidade e possíveis efeitos colaterais de drogas recém-desenvolvidas em diferentes células do corpo.
Limitações e obstáculos para o uso das iPSCs
O uso clínico das iPSCs ainda está em fase de teste. A geração de iPSCs usa sistemas retrovirais ou lentivirais, portanto, é preciso se preocupar se os sistemas virais são incorporados ao genoma do hospedeiro. Além disso, são feitas modificações genéticas nestas células que potencialmente podem gerar mutações. Esse fenômeno mutagênico talvez seja um dos principais obstáculos dessa tecnologia.
Outas desvantagens incluem alguns relatos em artigos científicos de envelhecimento prematuro destas células e alta taxa de apoptose. O alto custo para a reprogramação e diferenciação das células também são barreiras a serem consideradas.
Apesar das iPSCs representaram uma quebra de paradigmas éticos quando comparada às células-tronco embrionárias, existem alguns entraves legais que também devem ser observados. Como as células doadas contêm informações privadas na forma de DNA, deve-se garantir que a privacidade de doadores e pacientes seja protegida. O consentimento informado deve ser obtido tanto do doador quanto do receptor de células
O potencial uso para fins ilegítimos das iPSCs também deve ser debatido. Esse tipo de tecnologia torna viáveis aplicações condenáveis, como a clonagem humana, geração de quimeras humana-animal e geração ilegal/antiética de gametas humanos.
Por isso, leis e padrões devem ser implementados para garantir a integridade ética da produção e aplicação da tecnologia, assim como para remover barreiras desnecessárias no caminho da pesquisa e terapia com iPSCs. Sem dúvidas, as iPSCs representam uma revolução no campo da terapia celular, assim como no desenvolvimento de novos tratamentos farmacológicos.
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Referências:
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